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Fachada do cemitério do Ss Sacramento.

Desde a antiguidade, a morte inerente ao ser, é vista como enigmática e mágica, sendo por isso carregada de ritos e sinais. Os egípcios mumificavam, em Roma, Grécia e Índia cremavam em piras espetaculares.

No Brasil Colônia era rito despojado de requintes, geralmente lamentosos e lúgubres realizados nos enfumaçados e fétidos templos onde sepultavam em cova rasa ao lado dos altares os ricos e importantes figuras; aos pobres o adro das igrejas a quem pagavam a fábrica, termo usado para o enterramento.

Enterravam-se em caixões de tabuas, cobertos de pano, em redes, lençóis e esteiras. Depois de sete anos os ossos eram removidos dando espaço a novos sepultamentos.

O surgimento das irmandades religiosas tinha como preceito básico o “dar sepultura” aos irmãos.

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Os ossos de D. Jovitinha encontrados na matriz sob o altar de S. João.

Aos doentes terminais ministrava-se o Santo Viático, preparando o falecido para o reino do céu. Morto, o defunto era posto sobre uma mesa coberta de preto ou roxo e em volta a família se reunia para rezas e cantorias. Varavam a noite e o dia naquele espetáculo macabro em que não faltavam gritos, lamentos, gestos extremos de arrancar cabelos, cobrem-los de cinza e rasgar roupas em atos de desprendimento aos prazeres terrenos.

Durante os velórios eram servidos café, chá e bolinhos para passar uma noite em claro.

Os ricos redigiam testamentos nos quais legavam dinheiro aos pobres que acompanhassem o defunto à sepultura; destinavam bens as irmandades em troca de sepultura, missas e velas.

Embora imprevistos, os velórios e enterros seguiam preceitos com determinação de trajes, tipo de solenidade e aparatos a serem seguidos, às vezes como última vontade do recém-falecido. Um evento misto de publico e privado.

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Caixa dos ossos da mulher do Dr. Ladislau de Carvalho Arahujo.

Para os negros africanos, momento de festa, para comemorar…

Com a Abertura dos Portos, em 1808, novos requintes foram sendo incorporados pelas classes abastadas e a simplicidade do Período Colonial foi substituído por um luxo e requintes próprios a prosperidade reinante.

Os Santos Viáticos, transformaram-se em espetáculos, com sinos, incenso, palio e acompanhamento das irmandades do moribundo que ao falecer virava atração de um evento para o qual não faltavam decoração, flores, velas, convites, comidas variadas e farta, bebida e música das marchas fúnebres aos cânticos das carpideiras contratadas para chorar e elogiar o morto.

O enterro em carruagem emplumada de negro com cortinas de veludo e franjas douradas lembravam as procissões do Senhor Morto. Na igreja, lamentos, elegias e discursos, missas de corpo presente, distribuição de esmolas aos pobres e o enterro no local de acordo com a importância do morto.

D. Francisca Barreta e o Comendador Joaquim Thomaz de Farias mandaram construir a magnífica igreja de N.S. da Boa Morte em pedra e cal para nela serem enterrados e ela deixou expresso em testamento que não quer que levem seus ossos para casa, como de costume, mas mantê-los em lugar Santo, no caso a igreja construída por ela.

Manoel Francisco de Almeida mandou construir a igreja de São Pedro para o mesmo fim.

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Interior de uma igreja. As pessoas sentadas sobre as sepulturas.

Aos comuns, após sete anos a família organizava outra cerimônia para retirar da sepultura os ossos do parente e levá-los para casa.

O rico médico Dr. Ladislau, Jose de Carvalho Arahujo, sócio do Barão de Barcelos, mandou confeccionar no melhor mármore uma caixa para os ossos da mulher Jovita Maria, mandando colocar sob o altar do padroeiro. Uma relíquia da Irmandade que deveria virar atração, pois nos diz de como a morte era vista naquela época.

Uma declaração de amor era impressa na pedra.

Com a construção dos cemitérios, nos anos de 1850, algumas famílias transladaram os ossos dos parentes, construindo para isso, magníficos ossuários em mármore enfeitados c vasos e estatuas.

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Enterro de pobre.

Enterravam-se os mortos no interior ou no adro das igrejas e o contato com os restos mortais era imenso, levando a muitos problemas em época de epidemias. Após a cólera, na década de 1850, decretos imperiais proibiram essa prática e os cemitérios começaram a ser levado para os arrabaldes das cidades.

F.J. Martins fala da construção do cemitério do SS. “… presentemente acha-se a irmandade construída o seu cemitério nos subúrbios da cidade… o terreno para obra doou-o o alferes Bernardo dos Santos Souza e fica em lugar cômodo e aprazível encravado em terras de sua fazenda Coqueiros… A obra é edificada com elegância e proporções adequadas aos fins a que se destina, tem uma capelinha no terreno e sólidos pilares na frente do edifício e compreende o todo um recinto de cem palmos de frente e cento e quarenta e cinco de fundos. A obra tem sido feita a custa do cofre da irmandade e esmola dos fiéis e por dedicação do irmão provedor Tenente Francisco Ferreira Pinto, natural da freg. de S. Gonçalo de Niterói e proprietário do 2º oficio de tabelião da cidade.”

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Vários tipos de carruagem para enterro. Desenhos de Debret.

Francisco Ferreira Pinto era pai de Chilperico e de minha trisavó Carolina Sena.

Já em 07/08/1859, morreu meu 5º avô, Antônio José Alves de Oliveira, bisavô de Jorge Lobato. A relação dos gastos com a cerimônia de funeral incluía: cartas para Convites, 15 metros de setim roxo, 17 de galão de cordão, 21 de renda dourada, 400 cravos dourados, 500 tachas de bomba, alfinetes, tecidos para forro e aluguel de sete tocheiros dourados, além da armação para casa. Deve ter sido um luxo…

Já a firma de enterros de Joaquim da Câmara Pavão, oferecia aluguel de carruagens, tocheiros, eça e tudo que era necessário como grinaldas e coroas.

O luxo e o aparato procurava distanciar os homens até na hora da morte. Havia também os que não tinham mais que duas pessoas para conduzir uma rede e enterrar-se numa cova rasa.

O Mestre De Bret, trazido p D. João VI na Missão Francesa, retratou como ninguém o cotidiano do nascente Brasil. Aqui algumas das pranchas, ele mostra o universo da morte.

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Relação das despesas com o velório de meu quinto avô Antonio José Alves de Oliveira, pai de vovô Manoel Antonio Oliveira Cruz.


Por Fernando Antônio Lobato Borges